você que já veio e você que está

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

sobre casais dos quais não faço parte e sorvetes moles, e corações

estou lendo crônica de um amor louco e ela parece ser ariana e a conta chega e eles a dividem. ela passa 40 no crédito e ele debita o que sobra. é um garoto bem bonito, e ela parece uma dessas loiras de big brother que  mostram a bunda numa dessas revistas. meninos com suas namoradas. o que sinto agora fica em algum lugar do outro lado da felicidade, pensei. sem aquela garota ali eu poderia jurar que se trata de um viado, mas não era, não era nada viado. o garçom olha pra mim coaquela cara obsessiva, me comendo com os olhos, e não é porque garçons são criaturas atenciosas, e eu bem que gostaria de dizer olha, cara, você não vai conseguir nada por aqui, e ele insiste e dura horas servindo aquele copo d'água numa languidez que eu não veria numa tartaruga, e eu olho pra baixo. a menina cruza o olhar no meu com algo que parece ser ciúme. e eu sigo olhando de rabo de olho. eu daria praquele cara. mas aí a gente acordaria e ele diria bom dia e tudo daria errado depois de então. eu de certa forma até gosto desse lugar de observadora-passiva-analítica. veja bem, eu não estou envolvida. ele pode olhar pra qualquer bunda ou comer várias bocetas e tá tudo bem porque eu nunca vou ter nada com isso, eu simplesmente não estou envolvida, não é maravilhoso?, mas também não estou lá quando ele chega no apartamento louco pra se deitar na cama e recostar a cabeça sobre um peito e braços quentes e discutir kerouac ou dizer que se sente mal. bem, é o preço que se paga. um casal passa rapidamente por mim, eu adoro escutar fragmentos de conversas dos outros, "e o que mais você gosta de fazer além de tirar fotos?", and the man com aquela cara de vontade louca de disparar a falar de si. acho que esse é o grande barato de todo o lance, afinal. "tirar fotos", pensei. fosse eu a fotógrafa, consideraria aquilo uma ofensa. quer dizer, você não pergunta para um tenista o que ele gosta de fazer além de dar com a raquete na bolinha, nem nada do tipo. os dois na minha frente se levantam e vão. o restaurante tem uma cliente só, e então um novo cara, que se senta na minha diagonal esquerda, usa uma daquelas bolsas à tira colo que homens carregam sem parecerem bichas, pelo menos não por isso, uma calça jeans e camisa e sapatos sociais, e não me olha nem por um segundo. é como se eu não existisse. é como se o lugar estivesse cheio. é como se eu fosse aquele garçom olhando pra mim. não é como se eu me incomodasse com isso, mas não é verdade que é esquisito só ter uma alma além da sua num restaurante e você ignorar essa presença solenemente? é claro que é. decido pedir um tempura de sorvete, o garçom diz ok, e um bom tempo, pense em 15 minutos, se passa, e o garçom retorna dizendo que  o sorvete está mole demais para ser servido. é, o meu coração também está mole demais pra sair na rua e ele sai todos os dias e não tem nada que eu possa fazer à respeito disso, me veja o sorvete assim mesmo. não, não é possível retirar o sorvete do congelador agora, bem,
então
vá se foder,
por que você não
me disse
isso
15 minutos
atrás?, então me veja o diabo da conta. e a conta chega e eu pago e vou embora, pensando, pelo menos não gastei aqueles 13 reais a mais, e nem tenho que me importar com nenhum cara querendo comer nenhuma boceta.