você que já veio e você que está
sexta-feira, 31 de julho de 2009
Adeus ou Não posso te dizer pra onde vou porque não sei
Ele passava pelos lugares e, ao passo que ia se perdendo e se reencontrando no caminho, me dava algumas recomendações. Tudo muito esquisito, é claro. Eu, com vinte e seis anos, sabia muito bem que era pra ter cuidado ao andar na Voluntários à noite, que o metrô não era muito seguro depois das oito horas, que o Koni estava subindo de preço e por isso seria inteligente guardar aquele cartãozinho que te dá um desconto após a compra de dez konis, e vai por aí. Ele me dizia isso tudo repetindo algumas vezes as mesmas coisas - você não me vai ficar andando por aí na Voluntários tarde da noite. E o metrô, você cuidado com o metrô, hein! Que metrô depois de oito horas é um perigo. Guarda também o cartãozinho do Koni que dá desconto porque o preço dos Konis só faz subir. E não me vai ficar andando por aí na Voluntários depois de escuro, hein! -, parecia ausaimer. Era um festival de ''eu, heins''.
Chegou num assunto que eu além de ouvir fiquei prestando atenção e ainda de quebra respondi. Era sobre uma gentinha que eu odiava e que ele amava. Eu disse que ele não prestava. Que aquilo tudo era culpa dele, que ele não prestava, que ele não prestava, ele chorava, eu gritava mais, quanto mais ele chorava mais eu gritava, que aquele chororô estava me dando uma porra de um ódio dele, mas um ódio dele! Saí do carro batendo a porta o mais forte que os meus pequeninos braços me permitiam (bem mais forte que o suficiente), gritando todos os palavrões que constavam no meu acervo léxico - putaqueopariucaralhoseufilhodeumaputaquemerdacomoéqueeufuiconfiaremvocêvocêémesmoumfudidodemerda" - e jurando nunca mais querer olhar a fuça daquele rapaz novamente em vida. Isso foi verdade por um tempo.
Três meses depois lá estava eu, com uma rosa em uma mão e um pedido de descupas pela minha esquentadês. Toquei a campanhia da casa dele. Esperei um tantinho, ninguém abria, resolvi ligar para o seu celular. Caixa postal. Toquei mais uma vez - dona Cida? Estelinha? -, cadê a mãe, a irmã? Ninguém? Abriu a mãe - quanto tempo, minha filha - ela dizia isso com o ar deprimido que nunca tivera. Trajava um longo vestido negro muito simples, não estava maquiada, como eu havia guardado a sua figura em memória. Achei-a pálida e demasiadamente infeliz. Perguntei o que havia acontecido - cadê ele? É que trouxe uma - ela me interrompeu - eu achei que vocês estivessem brigados, ele estava tão mal -, eu me animei nessa hora - ah, nós estamos, sim! Mas quero fazer as pazes. Eu trouxe uma rosa! - dona Cida chorou muito, muito, muito, muito, quando eu disse isso. Mal podia sustentar-se em pé. Foi cambaleando com minha ajuda até o sofá, onde apoiou seus braços, ajoelhada no chão e cabisbaixa. Desesperei. Sacudi a pobre mulher até que ela me falasse o que havia acontecido - ele morreu - disse seca - já tem três meses. Parei.
Eu olhei para qualquer lugar. Não via nada. Só conseguia sentir os meus olhos enchendo-se de lágrimas. O meu corpo todo tremendo como que num choque - o quê? -balbuciei - ele não ia viajar? - tudo isso imóvel. I-mó-vel. - Ele - controlou-se dona Cida, e tentou me explicar com as poucas palavras que lhe restavam - te disse isso para que você não sofresse - mas ele me disse um nome! Um nome! Pra onde ele ia! Pra onde ele foi? Eu vou atrás dele! Eu vou atrás - chorei, choramos. Uma no colo da outra, como mãe e filha. - Ele não te disse para onde ia, minha filha - dona Cida, numa última fala -, porque nem ele sabia.
quarta-feira, 29 de julho de 2009
Gás
que fura a minha bunda e
faz cócegas nas narinas
sendo preta e vermelha
mais preta que vermelha
eu te amo ah!, eu te amo
é só por tua causa
faz do meu copo, gaiola
pro meu corpo, esmola
coca-cola
segunda-feira, 27 de julho de 2009
A carta
“Agora é tarde para pedir que eu volte, Lucinda – Lucinda, nome interessante – pensou a puta -. Não dá mais tempo! Eu disse, não disse? Eu avisei que me matava, não avisei que me matava? – a puta se sentou acompanhada de um leve sorriso na cara – não fui eu! Não fui eu! O homem virou presunto porque quis - mas quem acreditaria nisso? Foi em que esqueceu de pensar a puta – agora não adianta mais, Lucinda, me pedir desculpas. Se queria ter feito isso, tinha que ter feito antes. Pedisse desculpa antes de eu me matar. Eu espero que você sofra bastante, sabe, Lucinda. Sofre bastante mesmo, que nem eu sofri por você quando era vivo – essa é a parte em que o defunto esperava que Lucinda chorasse; aplicar verbos no passado referindo-se a si mesmo sempre funciona, é bem dramático e costuma fazer chorar na certa -. Adeus, Lucinda. Tenha uma boa vida”
A puta estava num êxtase misturado de sentimentos como felicidade, medo, pena, pavor. Ele não tinha nada que ter se matado, não tinha nada – ela refletia consigo mesma. Então que uma mulher vale tanto assim? Uma vida? Terminou de apiedar-se dos problemas alheios assim que percebeu o tamanho do próprio: ela precisava sair correndo dali antes que algum serviçal batesse a porta ou, pior – imagina, meu deus! Uma coisa dessas! –, antes que resolvessem entrar com a chave mestra. Era um motel desses luxuosos. E o problema era o problema que surgiria por trás daquele problema: tudo bem, ela poderia pegar algum dinheiro na carteira do homem, se vestir e ralar peito do local o mais rápido possível, mas todo mundo de fato acharia bem estranho uma moça que visivelmente era uma puta saindo de um motel desacompanhada e pagando a própria conta! Algo com certeza não estaria certo. Então ela viu-se num beco sem saída. Pois se ela fizesse isso, voltariam ao quarto e encontrariam o corpo, supondo com veemência que se tratava de um assassinato. A primeira opção em que pensou foi chamar a polícia. Mas sendo uma puta, quem seria presa era ela (à época, auto-comércio era crime). Podia fingir que não era puta, mas – ah, deixa pra lá, ela não era atriz, não ia dar certo, num ia, num ia. Olhou em volta ansiando por uma janelinha que fosse. Parecia a melhor alternativa, sair pela janela, sem ser vista. Não havia, porém, nenhuminha. E mesmo que houvesse, se alguém a pegasse fazendo isso, seria como se entregar numa bandeja de prata, confessar um crime o qual nem havia sido ela quem cometera. Depois de mil e outras idéias, todas ruins, decidiu-se: parecia-lhe a única solução, a única, senão não teria sido a escolhida. Tomou a faca em mãos e cortou o pescoço, deixando-se cair sobre o corpo do homem.
Por falar na carta, ela haveria de ser encontrada uma hora ou outra. E agora ela olhava para os dois, que não olhavam para lugar nenhum.
sábado, 25 de julho de 2009
Do que você se diria se soubesse se escutar
Germana colocou as mãos na cabeça e tudo rodava. Tudo tudo tudo rodava, dos passeios ao shopping à garganta que latejava. Era filho, louça, homem, louca. Louca, louca, louca! O mundo, o que ele queria dela? Ela, o que ela queria do mundo? As meninas que brincavam, ela já não tinha mais o seu viço, os cachorros balançando os seus rabos eram bem mais felizes. Alguma coisa a atormentava e, nem ela, nem essa pobre narradora ousam saber o que seja a tal da coisa. Ela queria chorar e – olha que interessante – ela já não chorava fazia tempo!
- Papai!
Ela gritou por seu pai, o que era estranho, estranhíssimo: o pai houvera morrido já nem sabia mais há quanto tempo. E ela nunca fora tão apegada a ele assim, pra sair gritando papai enquanto rodava.
Agora era ele que ela queria. Ele ele ele. Ela não podia mais ficar em pé, a cabeça, o pai, o pé, a garganta.
O pé doía de ficar em pé.
Ela doía de ficar de pé.
Queria o pai, ela doía e ardia em todas as partes, queria a feira de bonecos de pano que ia aos domingos de trinta anos atrás, queria o Juca e o Felipinho, usar fraldas e tomar na mamadeira, quem sabe. Queria não saber e nem nunca ter ouvido falar na palavra “computador”, queria não ter chegado aos quarenta e cinco na era da internet e da tecnologia, ela não suportava ser quem era, estar onde estava, conhecer o que conhecia. Tudo o que fazia parte de seu mundo lhe era estranho e lhe parecia alheio. Ela não queria fazer parte de si mesma.
Ao que parece, é claro.
Devia ter sido bailarina. Fugido de casa pra ser bailarina – fugisse de casa (tinha um banheirinho na academia de dança em que ela definitivamente poderia ter se ajeitado, com um colchonete)! Não tê-lo feito foi pura covardia. Foi fraqueza que definiu toda uma vida de infelicidade. Ela agora sentia nojo do jaleco. Tinha feito medicina mesmo sem nem poder olhar uma gota de sangue. Que se olhasse, desmaiava. E se desmaiava, o paciente morria. Abertinho, todo descosturado. Já sentia nojo do jaleco e dela. Aquelas mãos conheciam tanto sangue! Já haviam se misturado com ossos, pulmões, veias-cavas. Nojo nojo nojo.
Germana não foi feliz em nenhum momento. Nenhunzinho que fosse. Feliz, a Germana?
Os maridos que ela arrumara tinham sido todos uns inúteis – tudo culpa da mãe dela. A mãe dela era uma vaca, a mãe da Germana.
Germana sempre achou bonito ser grande. Bailarina, pra ela, era grande. Ela queria ter sido bailarina, a Germana.
Agora ela só sabia era rodar com as mãos na cabeça.
Aí ficava rodando, pra tentar imitar as bailarinas.
quinta-feira, 23 de julho de 2009
Cabô fragmentado (roots)
dessa boca que me disse
o quê, não posso dizer
pois disse se eu dissesse
me maldiria
e esta boca ela mesma
teria-me dito as doçuras
mais doces que eu ouviria
2 - estamos no ponto em que olhar já satisfaz
3 - muito verdes
os teus belos olhos -
são como a Rodrigo de Freitas
só que transparentes
4 - a maldade que o vento traz
será ela tão bela
quanto a beleza
tão triste quanto a tristeza
ou apenas má?
5 - eu vivo
e enquanto isso
eu morro
de saudades
6 - o amor nosso é o só
o só eu
e o cúmulo
é a tua presença
ausente
7 - ser sem ti
é como ser contigo
só que preto
quarta-feira, 22 de julho de 2009
Sei lá
Com quatro filhos pra criar, o negócio fica diferente. A gente tem que se dobrar em oito pra dar de mamá, comprar comida, levar na escola, botar pra dormir, cuidar quando adoece. É foda. Ser mãe solteira é foda.
E além de tudo eu já não era comida, assim, de dar gosto, há uns três anos. Três anos! Você sabe o que são três anos sem uma boa trepada? Ou, nem precisava ser tão boa, mas uma trepada qualquer? Não sabe. Não, não sabe. É que na falta de tempo não dava tempo mesmo, né. E na falta de homem, não tinha homem.
Não que eu fosse feia. Eu sempre fui bastante ajeitadinha, nunca deixei de ouvir uns fiufius quando passava.
As coisas começaram a ficar apertadas, e eu já não podia mais alimentar cinco bocas trabalhando em casa de família. O dinheiro era curto e não dava era pra bosta nenhuma. Um batonzinho, então, eu não sabia o que era fazia tempo...
Tudo isso não bastasse, eu ainda estava subindo pelas paredes. Precisava dar. Dinheiro, sexo, filhos, filhos, sexo, dinheiro. Dinheiro, dinheiro, dinheiro, filhos. Filhos, filhos, sexo, sexo. Dinheiro, sexo, dinheiro, sexo. Uma semana mais e eu seria capaz de... sei lá. Nunca fez tanto sentido!
Sei lá foi o que eu fiz.
Afinal, com quem o sexo pode fazer melhor comércio que com o dinheiro?
terça-feira, 21 de julho de 2009
Eu, hein
domingo, 19 de julho de 2009
sábado, 18 de julho de 2009
Menina palco luz e e e
Tô louca ou tá certo?
sexta-feira, 17 de julho de 2009
Amélia e o outro
quinta-feira, 16 de julho de 2009
Laranjeiras quando passa pela fonte da saudade e tal
pense que eu deixei de
amar os seus bancos cinzinhas ou
que deixei de poupar
os seus-só-seus doisevinte por vez
é só que venho querendo estar
a algumas laranjeiras
do túnel rebouças.
(mas prometo que é só uma fase)
segunda-feira, 13 de julho de 2009
Querido Orkut (ressurgimento)
O pior é que tem gente que perde tempo com essa merda. O pior é que tem gente que perde tempo lendo essa merda. O pior é que tem gente que perde tempo falando de gente que perde tempo lendo essa merda.
domingo, 12 de julho de 2009
Cabô
dessa boca que me disse
(mirei a tua em beijo
o quê, não posso dizer
sorri)
pois disse se eu dissesse
me maldiria e
esta boca ela mesma
estamos no ponto em que
teria-me dito as doçuras
mais doces que eu ouviria
olhar já satisfaz
muito verdes
a maldade
os teus belos olhos
que o vento traz
são como a rodrigo
será ela tão bela
de freitas
quanto a beleza
tão
só que transparentes
triste quanto a tristeza
ou apenas
eu vivo
má?
e enquanto
isso eu morro
de
o amor nosso é o só
saudades
o só eu
e o cúmulo
ser sem ti
é a tua presença
é como ser contigo
ausente
só que preto
segunda-feira, 6 de julho de 2009
Desabafo
domingo, 5 de julho de 2009
Sábado de manhã (ontem de hoje)
sexta-feira, 3 de julho de 2009
Amarílio
A minha vida
É da mesma cor amarelo-ferida
Da ferida
Que você feriu
Em mim