você que já veio e você que está

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Aparelhagem

Felizmente não há tempo
De ceder a nenhuma angústia
É preciso força para o insuperável
Quando o fatídico destino aponta
As suas armas 
Para as nossas cabeças.

Não tenho pretensões de avanços magníficos
Por causa de nenhum copo de saquê
Ou de flores no caminho 
Apenas sei da necessidade
Do olhar esquivo 
Do peito vazio
Que apesar de ou por isso
Continua palpitando

Sempre haverá alguém 
A jamais querer participar 
Da sua felicidade.

domingo, 23 de junho de 2013

lágrimas no escuro

venha depressa
não vamos olhar para os lados, meu bem, deixe
que os lados olhem pra
gente

me dê a mão
vamos cair fora daqui o quanto
antes

não seja bobo
é claro que te amo
eu só sou jovem demais e
me quero livre demais
para sair gritando uma
coisa dessas

talvez pelo perigo que corro te amando
te amar seja mesmo uma questão de honra

talvez eu chore se nos falarmos ao telefone
mas no fundo eu sou a mesma
a que te quer livre vestido de azul
colocando sonhos vermelhos em
prática

talvez eu chore se não nos falarmos ao
telefone
mas você nunca saberá
porque nem sempre se vê
lágrimas no escuro




segunda-feira, 29 de abril de 2013

DO NOT


palavra que diz

toda palavra que diz
faz cócegas em meus tímpanos
e te imagino debaixo dos panos
a cada palavra que diz.
hoje não te retorno.
posso me lembrar de cinco ou seis tardes
em que retornaria.
enquanto o Vento
jogava para lá
e para cá os cabelos
dos que se Aventuravam -
e eu nuvem-negra -
tomando cinco ou seis
chás de cadeira.
cansada disto.
de saber isto.
de viver nisto.
de comer

inter esse

talvez sesse
se eu me intere
se se

crônica

meus olhos nem querem saber
se a eles és indiferente
olham 
pros teus 
cronicamente

quinta-feira, 18 de abril de 2013

se essa rua se essa rua fosse minha
eu andava eu andava até correr.
e corria e corria até ganhar.
e ganhava e ganhava até cansar.

mas
essa rua
essa rua
não é minha.
é pro meu
é pro meu rancor
passar.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

mesmo que talvez não mereças esta madrugada insone

escolher estar contigo
não pela ansiedade bruta com que me
avassala a tua ausência compulsiva
mas por uma paz que aspiro
você estando por perto.

o temor de te perder faz
bambas minhas duas pernas
te esperei esse tempo todo
sem a pressa dos que querem
e agora confundo os teus passos
que você confunde.

aquele beijo
cheirou a adeus
à minha sensibilidade.

não quero chamar teu interesse
na minha direção
quero que a minha direção
chame o teu interesse.

quarta-feira, 13 de março de 2013

sempre afundando a cara no mesmo
travesseiro
numas de o barulho da chuva
batendo na caixa
do ar
condicionado
não puxar de dentro de mim
todos
os demônios do
medo.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

entrevista

me sentia bem em não participar dessas coisas. tudo o que eu costumei agradecer na minha vida tinha algum tipo de relação com o fato de eu poder ficar encolhida na minha toca. mas em algum momento a hora chega. tocou a campainha. ajeitei os fios de cabelo que podiam se ajeitar, puxei o sutiã para baixo da blusa e rodei a chave na fechadura. era hora da aporrinhação. abriu-se um sorriso ruivo de mais de trinta dentes e cerca de um metro de altura, seguido de uma vozinha aguda de sotaque indefinido, olá, você que é a yasmin?, bem, você veio até a minha casa, o que você acha?, e então nos sentamos no sofá. o sofá é branco.

- dá licença.
- à vontade.
- nossa, que calor, não é?
- é, sim.
- e você assim, de preto, de manhã, com esse calor!
- ...
- podemos começar a entrevista?
- é claro.
- bem, então vamos lá. aqui é difícil de estacionar, não é?
- parece que é.
- onde você estaciona?
- não tenho carro.
- não tem carro?
- não sei dirigir. 
- autoescola?

eu sentia meus neurônios tendo vontade de me matar por tê-los colocado naquela situação. 

- bem, mas vamos lá. como está sendo, pra você, protagonizar este espetáculo?
- é um prazer e uma honra poder fazer parte de um pro
- desculpa, você teria um copo dágua?
- ...teria.
- eu poderia tomar um copo dágua e ir ao banheiro? rapidinho?
- vai em frente.
- ok. já volto. então, onde estávamos? 
- estava dizendo que é um prazer e uma
- honra...
- participar de um pro
- de um projeto...
- ...
- han, pode falar.
- ...participar de um projeto de tamanha responsabilidade, principalmente pelo fato 
- de que?
- pelo fato de que... desculpa, o que é que eu tava dizendo? 
- você se perdeu?
- é, me perdi.

meu doce, eu sou uma criatura sobrecarregada, está calor, visto preto, são nove da manhã e você está me exigindo um grau de humanidade que a minha condição de zumbi não pode dar conta.

- você pode me lembrar, por favor, do que é que eu estava falando?
- eu também não lembro.
- você não estava prestando atenção no que eu estava falando?
- não, estou gravando tudo.
- como você conseguiu repetir as palavras que eu disse se não sabia do que eu estava falando?
- eu escutei. só não prestei atenção.
- é assim que você costuma fazer entrevistas?
- é, sim. 
- como é que você pode fazer a próxima pergunta sem saber do que eu estava falando?
- você só poderia estar falando da minha pergunta anterior, e aqui nesse papel está indicada a próxima, então não tem erro.
- ...então tá bem. vamos lá. vamos fazer o seguinte, a gente deixa a resposta anterior pra lá e vamos pra próxima pergunta. 
- quantos quilos você precisou emagrecer antes de assinar o contrato?
- ovo. pastel. microondas. liquidificador, pastel, pastel, cores pastéis, camisetas de banda sem manga, megafone, microfone, estátua.
- nossa, não deve ter sido fácil! como é contracenar com um elenco tão poderoso quanto esse?
- escravos de jó jogavam caxangá, tira, bota, deixa o zé pereira ficar, guerreiros com guerreiros fazem zigue-zigue-zá. guerreiros com guerreiros fazem zigue-zigue-zá. 
- um elenco realmente memorável. como tem sido a resposta do público? como você lida com isso? 
- minhas tripas estão se retorcendo só de eu ter que ficar aqui olhando pra essa sua cara de imbecil. espero que esta merda acabe num breve período de tempo. ouve isso aí na sua gravação, sua VACA. with the lights oooout, is less dangerooouuuss. eu quero tchu. eu quero...
- tchá...
- ...tchááá. 
- realmente. os fãs não pensam em outra coisa. ficamos por aqui, então. tem mais alguma coisa que você gostaria de dizer?
- gostaria extremamente de voltar a dormir e de ficar rica o suficiente para pagar alguém que desse entrevistas escrotas como é o caso desta no meu lugar, e quem quiser tomar no cu está a partir de agora especialmente autorizado. e está aqui o telefone da repórter, pra quem quiser passar trote: 90873432.
- entenderam, não é, meninas? fiquem ligadas nas dicas da yasmin! (desliga o gravador) pronto. acho que temos um ótimo material!
- sem dúvida alguma.
- pode me acompanhar até a porta? 
- certamente.

outras vieram depois. e depois. 
aprendi a gostar.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

GENTE JOGUINHO


é engraçado como a loucura, a extrapolação, a fuga da lei, a fuga da regra, a dificuldade, o desafio exercem fascínio sobre. eis aqui um mundo onde dizer-se o que se sente é sinônimo de virar automaticamente, inclusive em percentual, desinteressante. vamos, escondam, crianças, o que pensam, o que querem, como, quem, quando, onde querem. não contem pra ninguém. o coleguinha da creche que te excitou (palavra feia), mariazinha, não conte pra ele. não seja fácil. não demonstre. não deixe. não permita.

eis aqui um mundo onde não se pode SER, precisa-se mistificar, mitificar-se. é isso - transforme-se num mito, e quem sabe assim. seja misto de mistério, mistério é sedução, mistério é charme, mistério é in. ninguém se interessa pelo óbvio. mas o que de realmente autêntico pode não ser óbvio?, o perfume de uma flor não é óbvio?, as cores de uma bandeira não são óbvias?, que os braços sejam colados aos ombros, isto não é óbvio?, e, por mais que a corriqueirice nos anestesie quanto a grandeza de qualquer desses exemplos, em algum lugar podemos reconhecer o seu valor. 

estou falando de como seres humanos se relacionam a espera de serem, respectivamente, surpreendidos a todo momento pelos demais. veja bem, isso não pode ser. não somos máquinas especias. não somos máquinas mais especiais que outras máquinas. comemos bosta à rodo, nos conformamos por hábito, desenvolvemos rotinas por necessidade de segurança. e, ainda assim, petulante ou inocentemente - seja como for -, nutrimos a vibrante ilusão de que aqueles que queremos que nos surpreendam não comem também a mesma bosta que todo dia mandamos pra dentro.

o negócio é mais simples, estamos convencidos de que nossa própria banalidade é a única banalidade legítima. quem mais for banal, pelo menos assim, tão descaradamente, não merece um segundo de nossa atenção. ó, vida cruel. eis aqui um mundo injusto, vê. não temos paciência para as caras lavadas alheias, queremos é o carnaval alheio - a fantasia, a serpentina, as máscaras alheias. as únicas caras lavadas permitidas?, as nossas.

tudo o que nos interessa é o joguinho. eu não sou diferente. você não é diferente. mas, do jeito que somos pervertidos, contraventorezinhos, já já a própria exceção, o próprio significado que se atribui à irreverência, aquilo que vive nos encantando, nos vai cansar. e o novo in vai ser PREGUIÇA de gente que se distorça. que FINJA uma imagem tal. que OCULTE o que quer que sinta. PREGUIÇA de JOGUINHO.

cara, pode considerar isso uma oração. eu estou considerando.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

eu posso me desapaixonar por alguém só pela memória do pé da pessoa.

para proteger suas vaginas, em vez de carefree algumas mulheres deveriam usar careless.

olho para o centro da cidade como se olhasse o teu rosto - as ruas sujas são as maçãs, que ainda sujas têm a sua poesia.