você que já veio e você que está

segunda-feira, 5 de março de 2012

"Abra-te, Sésamo - eu quero dar o fora" (stanislas jerzy lee) Ou É como peidar e torcer pra que não sintam o cheiro

éramos só dois caras de sexos diferentes fodendo sempre nas mesmas posições com uma musica ruim no fundo. eu soube exatamente quando a minha boceta ficou com cara de mesma. ele tinha uma porção de sapatos espalhados pelo chão e montes de garrafas de vinho vazias, e era claro e retrospecto que fazia uma espécie de questão de não se livrar delas. fodíamos e ele tinha olhos grandes como quisera o pau, e me encarava e dizia:
- garota, eu tenho o mó medo de você.
aquilo me deixava vaidosa como frango assado no espeto rotatório girando na frente de cachorro vira-lata. e aí eu fazia a mesma coisa todos os dias, enfiava a calcinha e a saia e o que mais tivesse pra ser enfiado e soprava no ouvido esquerdo, quente:
- olha, eu tô indo nessa. 
e aquilo o fazia querer morrer e eu sabia disso e por isso fazia e tornava a fazer e então fazia de novo e com ainda mais gosto. E numa dessas noites muito parecidas murmurou, com os lábios bêbados e se virando de lado:
- não vai...
eu "tinha que ir".
- você nunca vai levar a sério.
e daí parece que dormiu um sono profundo pra caralho, e eu tive que chacoalhá-lo como não faria a um suco artificial escrito "agite antes de beber" na caixinha. não havia meio de acordar. eu precisava que me abrisse a porta, não havia meio de acordar. vislumbrei as possibilidades. caminhei até a janela, alto como um quinto andar, embora fosse só o segundo, eu poderia descer por aqui, pensei, não é nada mal, ou poderia cair e morrer, pensei, não é nada mal. não dei bola para a idéia. voltei até a cama e o chacoalhei mais uma vez, desta numa ferocidade muito mais atroz, com vontade de vencer o jogo. e ele foi e caiu. no chão. e ficou estendido. por horas. fiquei olhando aquilo. era bonito. uma imagem bonita. voltei do banheiro trazendo um copo d'água e ele não moveu um músculo da testa quando despejei o líquido naquela carinha adormecida que parecia cheia de paz, como tão poucas vezes se podia presenciar. então me rendi ao corpo estendido no chão e me deitei sobre ele e torci para que não fosse um cadáver, não ainda, ora, eu dificilmente saberia lidar com aquela coisa se ela estivesse morta. 
se não me engano mais ou menos duas dúzias de vezes na vida olhou pra mim quase que suplicando que eu dissesse alguma coisa do tipo: 
- ei, cara, eu não posso fazer você feliz.
é claro que eu nunca ter dito complicou as coisas. duas dúzias de vezes que eu poderia ter metido o pé, mas você não quer ser esse tipo de fujão. que eu poderia ter me declarado pra valer, mas você não quer ser esse tipo de clichê. que eu poderia ter dito só verdades, mas você não quer ser esse tipo de idiota. tinha vontade de gozar só de olhar pra ele. você já deu o azar de saber o que é isso? cara, eu simplesmente não sabia a porra da diferença entre aquilo e a felicidade. saca? 
dei um jeito qualquer de cair fora, mas caí na besteira de voltar na madrugada seguinte, e em todas as madrugadas seguintes, e depois só em pensamento. tem uma hora que ou vira pensamento ou então viram dias e tardes e noites e madrugadas inteiros de uma vez, e não só madrugadas. se eu tivesse que eleger um momento para definir quando foi que minha boceta ficou com cara de mesma, seria por aí. 
passou um bocado de tempo. eu nutri alguma coisa como um sentimento grande e gordo que não cabe numa cadeira de ônibus convencional, e ele ficou entranhado debaixo da minha pele fazendo companhia pras minhas veias e os meus órgãos e sangue. e nesse tempo gigantesco e infindável eu vi todo o tipo de coisa, menos a linha do fim da história que te conto, que eu tava tão ansiosa pra puxar logo. bom, o lance é que ainda que aquela paixão olhasse fundo pro abismo, era só a porra de uma paixão. 
me meti a ir até são paulo, por um ou outro motivo. no caminho ia rezando. pelo menos pior que deus e os caras pudessem me oferecer.
numa daquelas paradas pra mijar, li numa máquina de café "um momento para sonhar" e aquilo me pareceu das coisas mais incoerentes e das piores propagandas que eu já tinha visto na minha vida. café não é justamente aquela coisa pra te deixar acordado, o direto oposto do que seria deitar e dormir e ter sonhos? puta propaganda ruim né? diferente de se fosse nome de álbum do joy division com o curtis suicidado na capa. porra, aí sim. um momento para sonhar. do caralho.
(fiquei hospedada na casa do ian. ele queria me levar pra ver a vista do terraço do prédio. eu subi aquelas escadas vermelhas de emergência me cagando de medo e quando cheguei no topo, no mais alto que aquilo poderia ficar, com as mãos já suando e os punhos fracos de tremer, retornei passo a passo até ter certeza de que aquilo em que os meus pés pisavam era o Chão. puta que pariu, eu me cago de medo de altura. depois, voltando bêbada pra casa, eu pensei: i wish i had gone there. em inglês mesmo, como quando tô bêbada de verdade.)
tinha olhado o relógio pouco antes, eram sete e pouco e agora eram sete e porrada. hora de voltar a rezar. 
o amor naquele momento estava muito mais para uma cobra peçonhenta que acabou de jantar o indefeso bambi que pra um cão, mesmo um dos diabos.