você que já veio e você que está

domingo, 11 de março de 2012

o outro lado do muro

você se escondendo.
estou te vendo por trás do muro. as mãos
ingênuas e a cabeça pendendo.
uma vez rapidamente cor de castanha pupila branco,
acho que vi olhos.
você não percebe que te assisto. rio
da maneira como você se acha invisível.
vou até você. estou vestindo um lenço grande e branco,
um lençol. um lençol branco molhado. o lençol se cola aos
meus ombros e barriga. descalça. pisando em pedras portuguesas geladas
pelas gotas de chuva que o céu derruba.
meus cabelos estão molhados. passeio até você. falo
com você.
oi. oi oi. Oi.
você finge de morto. não late. não dá a patinha.
eu tiro o lençol que me envolve. estou n u a. você não late.
você não morde. você finge de morto. eu jogo o lençol para o
outro lado do muro. fecho os olhos para ouvir o barulho do estilhaço.
não faz barulho. você finge de morto. eu tiro os cabelos. jogo para o
outro lado do muro, cerro os olhos, você finge de morto,
não faz barulho. arranco-me os punhos. arremesso.
não faz barulho. pinço a boceta. taco para o
outro lado do muro. você finge de morto. corto as pernas
os braços e atiro, e atiro a boca e as orelhas com ouvidos, e
pego o nariz e os peitos, umbigo, cu, costelas, dedos com unhas, pés
com dedos e unhas, lanço. cerro o par de olhos que resta.
não faz barulho. você finge de morto. você não late. você não morde.
continuo lançando os olhos. continuo lançando os olhos.
com o par de mãos que não me resta.